Fonte: Edição IstoÉ 

Por Sayure Ribeiro, feminista e graduanda em História na Universidade de Pernambuco.

Estava tentando não emitir uma opinião sobre esse assunto. Mas numa rápida passagem pelo Feed do Facebook, vi inúmeras postagens em relação a isso. 

E o que me espanta é mulheres, que se dizem "feministas", utilizar de argumentos chulos para demonizar a Luísa. Como exemplo, ela "deixar" o Whindersson, mesmo ele tendo sofrido de depressão e está "esfregando a raba" na cada de outro homem logo após o término do casamento. Ora,  mais uma vez a mulher colocada como a megera vadia na história. 

Não acredito que o empoderamento feminino, no princípio liberal, seja construído a partir de atos "individuais". E sei que existem problemas na construção teórica e prática da palavra "empoderamento". E devido a esses problemas, o termo é utilizado de maneira errônea e para fins que se adequam ao neoliberalismo e às propostas que servem ao patriarcado do que à luta feminista. 

No entanto, a pergunta que fica é: por que é tão incômodo a forma da Luísa se mostrar no clipe? E a resposta é simples: ela é uma mulher. Mulheres não podem ter liberdade sexual, sem que esteja atrelada ao consumo direto masculino. 

A relação da Luísa e do Whindersson, cabe a eles. Desvalorizar, perseguir e querer tirar o mérito do trabalho dela por conta disso, é a forma gritante de como o sistema patriarcal é moldado. Nós mulheres só "prestamos" quando estamos servindo aos homens. E esse ideal de "servidão" está atrelado ao papel de reprodução das mulheres, em serviços que estejam ligados ao "cuidado". Nesse caso específico, segundo a Kollontai, “as virtudes femininas - passividade, submissão, doçura - que lhe foram inculcadas durante séculos tornam-se agora completamente supérfluas, inúteis e prejudiciais”. E na sociedade capitalista, o tipo fundamental da mulher moderna, “está em relação direta com o grau de histórico do desenvolvimento econômico por qual atravessa a humanidade”.

Não venham com a desculpa de que "a música é ruim", porque que a maioria escuta coisas piores e "pornográficas". A questão é o falso moralismo e o machismo impregnado em cada mentalidade, inclusive em muitas mulheres. É ridícula a forma que esse episódio está se materializando. É duro pensar que todas nós estamos sujeitas a isso. E estamos sujeitas diariamente a todo tipo de ofensa, humilhação e julgamentos.  

Não ligar esse episódio à dominação do corpo feminino, à discussão do "lugar da mulher", ao patriarcado e ao machismo estrutural, é impossível. E a maioria dessas pessoas são homens que fazem "memes" ridicularizando a luta feminista. 

É preciso observar e perceber o quanto de machismo tem em cada "meme" que você posta, em cada "opinião" que você emite enquanto indivíduo; e qual é  a relação e o reflexo da sua fala com o que acontece em toda a sociedade, por exemplo, em cada mulher morta, estuprada e explorada.

Referência

Alexandra Kollontai, A Nova Mulher e a Moral Sexual (2011)