Por Ronilson de Sousa

A dinâmica própria do sistema do capital, baseada na exploração do trabalho e na acumulação privada da riqueza produzida, aliada a concorrência entre os capitalistas, impulsiona a desigualdade social, a concentração e a centralização do capital, além de sua expansão em escala mundial.

De acordo com Lenin (2012), o enorme aumento da indústria e o rápido processo de concentração da produção em empresas cada vez maiores constituem uma das particularidades mais características do capitalismo. Ao atingir um determinado grau desenvolvimento, a concentração por si mesma, conduz ao monopólio. Esta transformação da concorrência em monopólio constitui, segundo Lenin (2012, p. 39), “um dos fenômenos mais importantes - para não dizer o mais importante – da economia do capitalismo moderno”.

Lenin (2012) chega a resumir a história dos monopólios da seguinte maneira: 1) de 1860 a 1870, o grau superior, o ápice de desenvolvimento da livre concorrência. Os monopólios não constituem mais do que germes quase imperceptíveis; 2) depois da crise de 1873, longo período de desenvolvimento dos cartéis, que ainda constituem apenas uma exceção, ainda não são sólidos, representando somente um fenômeno passageiro; 3) auge de fins do século XIX e crise de 1900 a 1903: os cartéis passam a ser uma das bases de toda a vida econômica. O capitalismo transformou-se em imperialismo.

Todavia, Lenin (2012) considera que:

Nem todos os ramos da indústria possuem grandes empresas; por outro lado, uma particularidade extremamente importante do capitalismo chegado ao seu mais alto grau de desenvolvimento é a chamada combinação, ou seja, a reunião numa só empresa de diferentes ramos da indústria, que, ou representam fases sucessivas da elaboração de uma matéria-prima (por exemplo, a fundição do minério de ferro, a transformação do ferro fundido em aço e, em certos casos, a produção de determinados artigos de aço), ou desempenham um papel auxiliar uns em relação aos outros (por exemplo a utilização dos resíduos ou dos produtos secundários, a produção de embalagens etc.) (LENIN, 2012, p. 39).

Apesar de nem todos os ramos da indústria possuírem grandes empresas, uma particularidade do capitalismo nesse estágio de desenvolvimento é a “combinação”, que, segundo Lenin (2012), está relacionada ao domínio que uma empresa exerce sobre diferentes ramos da indústria, seja em fases sucessivas da elaboração de uma matéria-prima, seja como papel auxiliar em relação a outros. 

Nesse sentido, Lenin (2012) observa que o cenário atual é marcado pelo estrangulamento, por parte dos monopolistas, de todos aqueles que não se submetem ao monopólio, ao seu jogo, à sua arbitrariedade, e não mais a luta da concorrência entre pequenas e grandes empresas, entre estabelecimentos tecnicamente atrasados e estabelecimentos de técnica avançada.

“O monopólio, uma vez que foi constituído e controlando bilhões, penetra de maneira absolutamente inevitável em todos os aspectos da vida social, independentemente do regime político e de qualquer outra ‘particularidade’” (LENIN, 2012, p. 87).

De acordo com Lenin (2012), a partir de meados do século XIX, o capitalismo entra em uma fase particular de seu desenvolvimento: a fase imperialista. Ele destaca algumas características dessa fase do capitalismo: 1) a transição de um estágio do capitalismo de livre concorrência para fase monopolista. A concentração da produção e do capital levada a um grau tão elevado que deu origem aos monopólios, os quais desempenham um papel decisivo na vida econômica; 2) a fusão do capital bancário com o capital industrial, formando o capital financeiro e uma oligarquia financeira; 3) a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande; 4) a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si, e 5) a conclusão da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes.

O imperialismo é o capitalismo no estágio de desenvolvimento em que ganhou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro; em que a exportação de capitais adquiriu marcada importância, em que a partilha do mundo pelos trustes internacionais começou; em que a partilha de toda a terra entre os países capitalistas mais importantes terminou (LENIN, 2012, P. 124-125).

Lenin (2012) polemiza com a concepção de Kautsky sobre imperialismo, que, de acordo com Lenin (2012, p. 126), pode ser sintetizada da seguinte maneira: O imperialismo é um produto do capitalismo industrial altamente desenvolvido. Consiste na tendência de toda a nação capitalista industrial em submeter ou anexar regiões agrárias cada vez mais extensas, independentes da nacionalidade de seus habitantes.

Segundo Lenin (2012), o que é característico do imperialismo não é precisamente o capital industrial, mas o capital financeiro. Não é um fenômeno casual o fato de, na França, precisamente o desenvolvimento particularmente rápido, do capital financeiro, coincidindo com um enfraquecimento do capital industrial, ter provocado, a partir da década de 1880, uma intensificação extrema da política anexionista (colonial). O que é característico do imperialismo é precisamente a tendência para a anexação não só das regiões agrárias, mas também das mais industriais (apetites alemães a respeito da Bélgica, dos franceses quanto à Lorena), pois, em primeiro lugar, o fato de a divisão do globo já estar concluída obriga, para se fazer uma nova partilha, a estender a mão sobre todo o tipo de territórios; em segundo lugar, faz parte da própria essência do imperialismo a rivalidade de várias grandes potências nas suas aspirações à hegemonia, isto é, a apoderarem-se de territórios nem tanto diretamente para si, mas para enfraquecer o adversário e minar a sua hegemonia (para a Alemanha, a Bélgica tem uma importância especial como ponto de apoio contra a Inglaterra; assim como Bagdá é importante como ponto de apoio para a Inglaterra contra a Alemanha etc.).

Lenin (2012) analisa que Kautsky separa a política do imperialismo da sua economia, falando das anexações como da política “preferida” pelo capital financeiro, e opondo a ela outra política burguesa possível, segundo ele, sobre a mesma base do capital financeiro. Conclui-se, então, que os monopólios, na economia, são compatíveis com um comportamento não monopolista, não violento, não anexionista, em política. Conclui-se que a partilha territorial do mundo, terminada precisamente na época do capital financeiro, e que é a base da peculiaridade das formas atuais de rivalidade entre os maiores Estados capitalistas, é compatível com uma política não imperialista. Isto leva a se dissimularem, a se ocultarem as contradições mais fundamentais do estágio atual do capitalismo, em vez de desvela-las em toda a sua profundidade; o resultado é o reformismo burguês em vez de marxismo.

Kautsky discute com Cunow, apologista alemão do imperialismo e das anexações, cujo  raciocínio tão cínico quanto vulgar é o seguinte: o imperialismo é o capitalismo contemporâneo; o desenvolvimento do capitalismo é inevitável e progressivo; consequentemente, o imperialismo é progressivo; consequentemente devemos prosternar diante do imperialismo e glorificá-lo! Este raciocínio se assemelha, de certo modo, à caricatura que os populistas russos faziam dos marxistas em 1894 e 1895: se os marxistas – diziam eles - consideram que o capitalismo é inevitável e progressivo na Rússia, eles devem se dedicar a abrir tabernas e a fomentar o capitalismo. Esta é a resposta de Kautsky a Cunow: não, o imperialismo não é o capitalismo contemporâneo, mas apenas uma das formas da sua política; podemos e devemos lutar contra essa política, lutar contra o imperialismo, contra as anexações etc. A objeção, completamente plausível na aparência, mas equivale, na realidade, a uma defesa mais subtil, mais velada (e por isso mesmo mais perigosa), da conciliação com o imperialismo, pois uma “luta” contra a política dos trusts e dos bancos que deixe intactas as bases da economia de uns e outros não passa de reformismo e pacifismo burgueses, não vai além das boas e inofensivas intenções. Voltar as costas às contradições existentes e esquecer as mais importantes, em vez de desvela-las em toda a sua profundidade, esta é a teoria de Kautsky, que nada tem a ver com o marxismo. E, naturalmente, o único objetivo de semelhante teoria, é defender a unidade com os Cunow! (LENIN, 2012, p. 129).

De acordo com Lenin (2012), Kautsky considerava que, “do ponto de vista puramente econômico, não está excluído que o capitalismo passe ainda por uma nova fase: a aplicação da política dos cartéis à política externa, a fase do ultra-imperialismo”, isto é, o superimperialismo, a união dos imperialismos de todo o mundo, e não a luta entre eles, a fase em que as guerras sob o capitalismo cessem, a fase da "exploração geral do mundo pelo capital financeiro, unido internacionalmente”.  Lenin (2012) explica que, se, por ponto de vista puramente econômico, entende-se a “pura” abstração, tudo o que se pode dizer reduz-se à seguinte tese: o desenvolvimento se dá em direção do monopólio; portanto vai na direção do monopólio mundial único, de um truste mundial único. Isto é indiscutível, mas ao mesmo tempo é algo completamente vazio, como seria dizer que, o “desenvolvimento se dá” no sentido da produção de gêneros alimentícios em laboratórios. Neste sentido, a “teoria” do ultraimperialismo é tão absurda como seria a “teoria da ultra-agricultura”. As ocas divagações de Kautsky sobre o ultraimperialismo estimulam, entre outras coisas, a ideia profundamente errada, que joga água no moinho dos apologistas do imperialismo, de que a dominação do capital financeiro atenua a desigualdade e as contradições da economia mundial, quando, na realidade, as acirra.

Ao analisar o lugar do imperialismo na história, Lenin (2012) destaca algumas das principais manifestações do capitalismo monopolista:

Primeiro: o monopólio é um produto da concentração da produção num grau muito elevado do seu desenvolvimento. Ele é formado pelas associações monopolistas dos capitalistas, pelos cartéis, pelos sindicatos e pelos trustes. Nos princípios do século XX, conquistaram completa supremacia nos países avançados, e se os primeiros passos no sentido da cartelização foram dados anteriormente pelos países de tarifas alfandegárias protecionistas elevadas (a Alemanha, os Estados Unidos), a Inglaterra, com o seu sistema de livre-comércio, mostrou esse mesmo fato fundamental, apenas um pouco mais: o nascimento de monopólio como consequência da concentração da produção.

Segundo: os monopólios vieram acirrar a luta pela conquista das mais importantes fontes de matérias-primas, particularmente para a indústria básica e mais cartelizada da sociedade capitalista: a hulheira e a siderúrgica. O monopólio das fontes mais importantes de matérias-primas aumentou enormemente o poderio do grande capital e acirrou as contradições entre a indústria cartelizada e a não cartelizada.

Terceiro: o monopólio surgiu dos bancos, que, de modestas empresas intermediárias no passado, se transformaram em monopolistas do capital financeiro. Três ou cinco grandes bancos de cada uma das nações capitalistas mais avançadas realizaram a “união pessoal” do capital industrial e bancário, e concentraram nas suas mãos somas de milhares e milhares de milhões, que constituem a maior parte dos capitais e dos rendimentos em dinheiro de todo o país. Uma oligarquia financeira, que tece uma densa rede de relações de dependência entre todas as instituições econômicas e políticas da sociedade burguesa contemporânea sem exceção: tal é a manifestação mais evidente deste monopólio.

Quarto: o monopólio nasceu da política colonial. Aos numerosos “velhos” motivos da política colonial, o capital financeiro acrescentou a luta pelas fontes de matérias-primas, pela exportação de capitais, pelas “esferas de influência”, isto é, as esferas de transações lucrativas, de concessões, de lucros monopolistas, etc., e, finalmente, pelo território econômico em geral. Quando as colônias das potências europeias em África, por exemplo, representavam a décima parte desse continente, como acontecia ainda em 1876, a política colonial podia desenvolver-se de uma forma não monopolista, pela “livre conquista”, poder-se-ia dizer, de territórios. Mas quando 9/10 da África já estavam já ocupados (por volta de 1900), quando todo o mundo estava já repartido, começou inevitavelmente a era da posse monopolista das colônias e, por conseguinte, de luta particularmente aguda pela divisão e pela nova partilha do mundo.

Os monopólios, a oligarquia, a tendência para a dominação em vez da tendência para a liberdade, a exploração de um número cada vez maior de nações pequenas ou fracas por um punhado de nações riquíssimas ou muito fortes: tudo isto originou os traços distintivos do imperialismo, que obrigam a qualificá-lo de capitalismo parasitário, ou em estado de decomposição. É com relevo cada vez maior que emerge, como urna das tendências do imperialismo, a formação de “Estados” rentistas, de Estados usurários, cuja burguesia vive cada vez mais à custa da exportação de capitais e do “corte de cupões”. Seria um erro pensar que esta tendência para a decomposição exclui o rápido crescimento do capitalismo. Não, certos ramos industriais, certos setores da burguesia, certos países, manifestam, na época do imperialismo, com maior ou menor intensidade, quer uma quer outra dessas tendências. No seu conjunto, o capitalismo se desenvolve com uma rapidez incomparavelmente maior do que antes, mas este desenvolvimento não só é cada vez mais desigual, em geral, como a desigualdade se manifesta também, em particular, na decomposição dos países mais ricos em capital (Inglaterra) (LENIN, 2012, p. 167).

Isso ocorre, como Lenin (2012) explica, pela tendência própria do capitalismo em separar a propriedade do capital da sua aplicação à produção, separar o capital-dinheiro do industrial ou produtivo, separar o rentista, que vive apenas dos rendimentos provenientes do capital-dinheiro, do empresário e de todas as pessoas que participam diretamente na gestão do capital. O imperialismo, ou domínio do capital financeiro, é o capitalismo em seu grau superior, em que essa separação adquire proporções imensas. O predomínio do capital financeiro sobre todas as demais formas do capital implica o predomínio do rentista e da oligarquia financeira; a situação privilegiada de uns poucos Estados financeiramente “poderosos” em relação a todos os restantes.  

Além disso, na fase imperialista, sob o domínio do capital financeiro, o capitalismo não atenua, e sim acentua a diferença entre o ritmo de desenvolvimento dos diversos componentes da economia mundial. O desenvolvimento desigual, por saltos, das diferentes empresas e ramos da indústria e dos diferentes países é inevitável sob o capitalismo. Não existe desenvolvimento igual deles no capitalismo. No caso dos países, a própria exportação de capitais influencia o desenvolvimento do capitalismo no interior dos países em que são investidos, acelerando-os extraordinariamente.

 

LENIN, V. I. Imperialismo, Estágio Superior do Capitalismo. São Paulo: Expressão Popular, 2012, 171p.